Senado aprova MP que permite a privatização da Eletrobras; texto voltará para a Câmara
Relatório de Marcos Rogério (DEM-RO) faz uma série de mudanças em busca de apoio à medida.
BRASÍLIA — O Senado aprovou, nesta quinta-feira, a medida provisória (MP) que permite a privatização da Eletrobras, que passou por uma série de modificações para conseguir apoio ao texto. A proposta será analisada novamente pela Câmara, o que precisa acontecer até a próxima terça-feira para a medida não perder a validade. Numa votação apertada, o texto foi aprovado pro 42 votos a favor e 37 votos contra.
A MP aprovada no Senado apresenta uma série de modificações em relação ao texto original e até mesmo em relação à proposta aprovada na Câmara. As mudanças são polêmicas, desagradam a parte da indústria e foram feitas para angariar votos a favor da medida.
O governo aceitou a maior parte das mudanças para conseguir avançar na agenda de privatização do ministro da Economia, Paulo Guedes, que até agora foi concentrada em subsidiárias de estatais.
O senador Marcos Rogério (DEM-RO) manteve a exigência de construção de termelétricas em redutos eleitorais sem infraestrutura de transporte de gás. Mas eliminou uma exigência considerada pelo governo uma trava para o projeto: a de que a contratação das usinas fosse feita antes da privatização. Na avaliação do governo, não haveria tempo hábil para isso.
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Outros pontos polêmicos foram revistos. Foi retirado o incentivo a usinas a carvão, uma fonte cara e poluente que tem sido deixada de lado no mundo todo. O recuo na contratação prévia de termelétricas foi um pedido do governo, pois a avaliação de técnicos era que essa obrigação poderia inviabilizar a venda da Eletrobras.
Sem carvão
O relatório de Marcos Rogério retirou a previsão de estender até 2035 um programa de subsídios para a geração de energia elétrica por usinas termelétricas movidas a carvão mineral, após críticas até da base aliada ao governo.
A extensão do benefício havia sido um pedido de empresas desse segmento e da bancada de Santa Catarina, que tem cidades com economia baseada na extração de carvão.
Além disso, para aumentar o apoio político ao texto, Rogério subiu de 6 megawatts (MW) para 8 mil MW a obrigação de contratar térmicas a gás nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste, o que vem sendo criticado por grandes consumidores. Serão outros 2 mil MW de pequenas as centrais hidrelétricas (PCHs).
O problema é que a maioria dessas térmicas serão instaladas em regiões onde não há suprimento de gás, o que obriga investimentos bilionários na construção de gasodutos. Quem defende a medida afirma que ela favorece a economia regional e que não haverá aumento na tarifa, pois haverá um preço-teto para a contratação das termelétricas.
Rogério havia apresentado uma versão nesta quarta que exigia a contratação das térmicas a gás antes da privatização.
Construção de térmicas
O relator estabeleceu que deverão ser construídos 1.000 MW na região Nordeste, 2.500 MW no Norte onde seja viável a utilização das reservas provadas de gás natural nacional existentes na Amazônia e 2.500 MW no Centro-Oeste.
Nos três casos, será necessário instalar as térmicas onde não há suprimento de gás, o que obrigará a construção de extensos gasodutos.
Também será necessário construir 2.000 MW na região Sudeste, sendo 750 MW onde não há fornecimento de gás. O restante poderá ser construído em regiões com fornecimento de gás, abrindo a possibilidade de uma térmica no Rio de Janeiro.
Apesar de haver um preço-teto para a construção das usinas — o que, em tese, freia os impactos ao consumidor —, a determinação de locais específicos para a sua construção encarece os custos do setor elétrico e é um incentivo à ineficiência.
Mesmo que a construção de termelétricas seja necessária para garantir segurança no sistema, não cabe ao Congresso escolher as cidades onde elas serão implementadas.
— Nós não estamos falando aqui de questões técnicas, nós estamos falando de barganhas que estão acontecendo nas últimas horas. E, em vez de cruzeiros, ou recursos, ou reais, ou emendas e tal, estamos negociando megawatts. Cada parlamentar está aqui regateando megawatts — criticou o senador Jean Paul Prates (PT-RN).
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Marcos Rogério defendeu as medidas:
— Cabe aqui ressaltar o papel fundamental que as termelétricas cumprirão. Este vai além da segurança energética e da modicidade tarifária. Inclui igualmente fomentar a interiorização do gás natural. O Brasil foi aquinhoado com gigantescas reservas desse combustível, porém elas são concentradas numa pequena porção de nosso litoral.
Outra mudança tira poder do Ibama e da Fundação Nacional do Índio (Funai) no licenciamento ambiental da linha de transmissão de energia Manaus-Boa Vista. O empreendimento foi leiloado em 2011 e sua previsão era de entrar em funcionamento em 2015, mas até hoje as obras não começaram.
Linhão sem Funai
A polêmica gira em torno da passagem do “linhão” pelas terras do povo indígena Waimiri-Atroari. Marcos Rogério e estabelece que, “uma vez concluído o Plano Básico Ambiental-Componente Indígena (PBA-CI), traduzido na língua originária e apresentado aos indígenas, fica a União autorizada a iniciar as obras” da linha de transmissão.
Na prática, haveria dispensa da aprovação pela Funai e pelo Ibama, responsáveis pela análise do licenciamento ambiental.
O governo ganhará menos com a privatização que o previsto. A previsão é que a capitalização da empresa levante mais de R$ 60 bilhões.
Mas o relatório muda a destinação de parte desse dinheiro. Metade irá para as contas de luz. Mais R$ 9 bilhões para a revitalização de bacias hidrográficas. E o restante (cerca de R$ 20 bilhões) para o governo. Antes, eram R$ 25 bilhões.
Mais mudanças
O texto faz mais mudanças. Proíbe mudanças nas sedes da Eletrobras, incluindo Furnas, Eletronorte, Eletrosul e Chesf, num prazo de 10 anos após a privatização. A Eletrobras também deverá realocar toda e qualquer população que esteja morando abaixo de linhas de transmissão de grande capacidade.
Pelo texto, empregados da Eletrobras que forem demitidos nos 12 meses subsequentes à privatização poderão ser realocados em outras estatais.
Marcos Rogério ainda coloca no texto uma forma de garantir o fornecimento de energia mais barato para a indústria da Região Norte e uma indenização de R$ 260,4 milhões ao governo do Piauí pela privatização da sua distribuidora de energia.
Pelo texto, a indicação dos diretores do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) precisará passar pelo Senado, mesmo o órgão sendo uma entidade de direito privado. Para integrantes do governo, isso pode levar à ingerência política no órgão que comanda a operação do setor elétrico.
Fonte: Manoel Ventura/Jornal O Globo/WEB TV Cidade MT